Outro dia mesmo, você vê, estava eu numa fila enorme, no banco. Atrás de mim, um cara de meia idade falava ao telefone com uma mulher que, suponho, talvez catolicamente: era sua esposa.
Conversava um tanto puto por conta da fila, que parecia mesmo infinda. Enquanto falava com ela, olhava de rabo de olho o início da centopéia, como quem parece maquinar algum plano maquiavélico.
Eu observava a evolução da conversa, atentamente mergulhada naquela outra vida; um dos prazeres que as filas proporcionam é o tempo.
Não o tempo corrido, que não se pega, mal se vê, mas, ora ora, o tempo do quase, o tempo do ainda: o tempo da espera. Eis o grosso desse fenômeno, eis o concreto desse mistério: quem diz que nunca tocou no tempo, o diz porque nunca precisou esperar.
O tempo da espera é tão real que pesa. É uma presença imperativa, altiva, tão pouco subordinada.................
uma presença que dói. Por muitas vezes dói. Nem sempre as pernas, as costas, a cabeça; dói por dentro. Num ponto tão misterioso quanto o tempo, tão pouco palpável quanto ele, mas que a dor faz tomar forma: a aflição da espera desenha o disforme.
Na fila do banco, quase ninguém vê. Olham seus relógios, analisam os ponteiros, param, pensam, falam com suas esposas, disfarçam a espera, ensaiam uma conversa qualquer - quem sabe o tempo - "que tempo!", disse um.
Da fila dos idosos, responde um senhor, cujo quadril se sustenta em pequenos galhos já bem gastos: "olha, eu não aguento mais esse tempo".
O asfalto até queimava, mas lá fora. O tempo que li nos galhos era outro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário