sexta-feira, 24 de junho de 2011

Resposta

eu não quero que você
sim
ou não

eu só quero que você
seja

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Não é poesia


Volta e meia começo coisas. Coisas que começo pra terminar, coisas que começo depois que termino outras, coisas que não terminam, coisas que começo, termino e volto, volta e meia.

Enfim, decidi começar hoje o projeto "correr na praia" 2011. Afinal, todo o ano, desde que tenho 10, começo uma atividade física específica em algum mês. É de praxe. Nesse vício, já fiz de yoga a muay thai, mas, embora fique muito gostosa de shortinho de laycra (cof cof), nunca gostei de correr. No entanto, os gostos mudam, o paladar amadurece e faço parte do grupo dos que têm a alma flexível, apesar dessa ser uma afirmação estranhíssima. Assim, tomei gosto e agora pretendo fazer isso pelo menos 2 vezes por semana.

Ok, não é isso o que importa. O que importa é que, para inaugurar o "projeto", decidi ir hoje até o MAC, que, pra quem não sabe, é o museu de arte contemporânea de Niterói. Acabei dando uma circulada pelo pátio, porque não dá pra resistir àquela vista. Aí, bom, não é só porque acredito na lei da atração, mas quem faz licenciatura ATRAI. É claro que tinha que ter uma excursão escolar, claro. No pátio, havia um grupo de uns 20 quase-adolescentes, as idades variavam, estudantes de uma escola pública. Como o MAC só abre às 10, estavam todos espalhados fazendo hora e eu, que sou uma boa observadora, de repente escutei a pérola "Eu nunca fui a um museu", seguida por outras vozes, que pipocavam: "nem eu".

É realmente inacreditável. São afirmações como essas que me inspiram a ser professora e plantar nessas cabeças um pouco mais de interesse, que cria a oportunidade. Um dos principais objetivos do professor, pra mim, deve ser semear a curiosidade, provocar o encontro com o novo e o interesse em descobrir. A fala desses meninos denuncia um sistema básico de ensino público predominantemente sem paixão. Triste.
Tudo bem, era uma excursão escolar, mas, o que quero dizer é que a afirmação do menino, de uns 14 anos, mostra que isso deveria ter sido feito há séculos.
Outro dia vi uma reportagem de uma menina estrangeira que pintava aos 5 anos. Tinha um senso estético incrível porque foi estimulada. Isso prova que não dá pra dizer que que as crianças, por si só, não têm o menor interesse. Ele precisa vir de algum lugar. Se eu contar que eles (na foto) pareciam ansiosos para abrir o museu e, quando abriu, saíram correndo, vocês nem acreditam.
Se admitimos, embora contrariados, que existem famílias de diferentes rendas dentro de escolas diferentes, concordamos que o estímulo deve partir do meio acadêmico. Ele deve funcionar de modo que alunos diferentes recebam os mesmos incentivos. Essa é a ideia. E a moral da história é que, o que eles dizem eu assumo como inspiração, pra digerir. Mas nada disso é poesia.

sábado, 11 de junho de 2011

Cotidiano

gente morre
gente todo o dia morre
trepa, casa, cria
e morre gente todo o dia.

cliente corre
cliente todo o dia corre
troca, compra, financia
e corre corre todo o dia.

urgente porre
urgente todo o dia: porre
trabalho, carro, monogamia
e porre urgente todo o dia

pente percorre
pente todo o dia percorre
trança, cremes, perfumaria
e percorre pente todo o dia

quente transcorre
quente todo o dia transcorre
truques, cabelos; taquicardia
e transcorre quente todo o dia

mente socorre
mente todo o dia socorre
trava, conclui, reinicia
e mente: socorre todo o dia.

presente escorre.

presente
todo o dia
escorre.

trepa,
casa,
cria,
e morre presente todo o dia.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Tensão pré-movimentação

Passei mais de uma hora na frente do computador, com vontade de escrever. Tenho mil coisas pra fazer, mas senti necessidade de ficar quieta, refletindo sobre a minha irritação. Fiquei puta da vida com essa passividade e descobri que não sei escrever irritada. Ou seja: me irritei ainda mais agora, porque passei horas improdutivas.
Quase sempre que me sinto irritável assim, preciso de algo novo. Já decifrei. Parece que a mínima inércia me causa tensão, que, porque estou viva e mergulho fundo no que me incomoda, gera algum movimento. Em tempo.

Aí essa TPM transgressora me diz duas coisas:

1- Você tem a história, pode conseguir algumas horas de dedicação e só vai saber se tem capacidade quando decidir começar, porra.

2- Faz outro blog, gata, porque procurar contos eróticos no Google e parar numa poesia, ainda vai, mas procurar abstração e esbarrar em tensão sem conto vai ser foda.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Divagações sobre o tempo presente

C: Nossa! Que-cheiro-bom.

: É. Perfume é um convite.

C: Nesse grau, ele inteiro é um convite.

: Aliás, não só o perfume, mas todo esse momento; o momento presente é um convite.

C: Convite ao quê?

: Um convite ao próprio momento presente.

C: Sei. E esse momento presente nos faz escolher. Isso me inquieta. Como garantir que essa escolha é a melhor? E aquilo de que se abre mão para escolher algo? E todo o resto que fica de fora?

: Então... Penso que a escolha é uma liberdade que se impõe. Quase um imperativo. E você tem a responsabilidade de fazer o melhor possível do seu presente. Ele é tudo o que se tem. É o que você pode devorar, então saboreie. O resto é suposição.

C: É, verdade. O resto é suposição... O problema pode estar (interrupção da mesa ao lado: "irmãozinho, quebra mais um galho aí") na suposição. Negam o presente, imaginando o que fariam com outras escolhas. Tipo o sexo: se você transa com um carinha x pensando no y você não vive x nem y.

: Pois é...

C: O que as pessoas vão achar se descobrirem que eu estou transcrevendo isso?

: Vão achar que o momento presente é tão importante pra você que ele precisa ser registrado. Seria fantástico fazer isso sempre... o passado é sempre tão relativo. Lembrança é afeto; não dá pra confiar. Você só pode ter certeza sobre o presente. E mesmo assim...

C: Tô te achando muito sartreana nessa mesa de bar em Vila Isabel.

: Adoro um boteco. Como se você, com essa boina, não fizesse um ar muito mais blasé.

C: Adoro um blasé.

: Perceptível. Bom, a moral da história, pra ser bem Vila Isabel, tá no bife dessa mesa aqui do lado. No bom português: tem que comer enquanto tá quente. Isso é valer o presente. O resto é mal-passado.

E ponto.

domingo, 5 de junho de 2011

Tempo da beleza

Eu: E a flor?
Ela, sentida: Você comprou tão madura que hoje, quando acordei, ela estava seca e aí eu... joguei fora. Deixar ela feia por aí seria um descaso.
Eu: Claro, você fez bem.
Ela: Acho que nós temos que abrir mão das coisas assim que elas murcham.
Eu: Concordo. É o tempo da beleza.
Ela: Exatamente.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Vale tudo

A vida começa no tapa, essa é a verdade. Quando aquele sujeito te tirou do dentro mais dentro que você já tocou e te fez humano num susto só, foi no tapa. Antes, você era quase peixe, numa quase-hidromassagem orgânica e habitava aquele esconderijo sem saber que se escondia. Você era o mesmo nada que é hoje, mas sem saber que é justamente ser nada o que te permite ser alguma coisa. É mesmo engraçado isso de ser sem saber que é. Mas era assim.
Pois bem, se eu tivesse qualquer capacidade linguística quando nasci, se eu tivesse nascido sabendo que sou, assim, só de sacanagem, eu teria dito alguma coisa ao cara que me tirou de lá de dentro e fez com que minha primeira experiência com tudo isso de ser fosse um choque. Porque um tapa não basta. Quando, depois da palmada, meus pulmões encheram de ar e percebi que eu era um corpo-quente-num-puta-ar-condicionado, certamente pensei: o drama continua, bb, a vida começa no tapa e no choque térmico. Nascer é dramático.
Se o anacronismo é o tom do texto, devo dizer que responderia a palmada com o grau de petulância que assumo hoje: Bate mais.
É isso mesmo, deixemos de hipocrisia: boa é a relação que começa na porrada. A respiração inaugura o primeiro round desse vale-tudo que é a vida, e é com um tapa que você vira gente.
Desde então, é só embate. E você vai descobrindo que viver também é dominar o próprio corpo e aprender a destilar prazer dessa disputa. Percebe que deve enfrentar a própria consciência e, com isso, se encontra, muitas vezes, no meio do ringue com a consciência do outro. Que delícia é, quando isso acontece. Um vale-tudo de verdade é um encontro de duas vidas que se permitem bater, apanhar e todo o resto. Eu sou dessas, quando a outra consciência me interessa.
Por isso, apesar de falar com certo mau humor da minha primeira experiência no mundo, não gostaria que fosse outra.
Um tapa afeta. Aliás, o tapa é a própria afetação, e deixar-se afetar é o modo mais gostoso de viver.