quinta-feira, 15 de setembro de 2011

P de perdeu, percebe?

Perdeu um amor e comprou o jornal. Pagou com duas moedas e pediu o troco. Procurou o isqueiro no bolso esquerdo da calça, onde sempre estava. Problema: esqueceu com a primeira com quem trepou pra esquecer o amor que partiu. Perdeu duas vezes.
Pediu fogo ao pedestre que fumava na marquise daquela padaria onde comprava pão enquanto o amor dormia. "Pode ficar com ele", o estranho disse, "Parece que você precisa mais do que eu." Precisava. Poder acender o próprio cigarro e poupar pedidos era exatamente o luxo que pedia naquela tarde pálida.
Perdeu um amor, comprou o jornal e sentou numa esquina. Pousou as notícias no banco do boteco: mais miséria em papel de miséria. Porca essa primeira página: pobres, programas de governo, presídios, presidência. Predisposição zero. Pensou nela. Pensou no peso do corpo dela. Pensou em saudade; não era aquilo? Pensou que se saudade não fosse aquilo não era mais nada. Passou a mão pelo rosto, como quem prepara o terreno à espera da chuva, mas ela não veio. Pior, tanto pior. Pobres desses que têm medo de chover.
Perdeu um amor, comprou o jornal, sentou numa esquina, pediu um café. Parou ali. "Pra viagem?", a atendente perguntou. Piscou e fez que sim.

Deixou seu amor de gorjeta e partiu; pra viagem.

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