C: Nossa! Que-cheiro-bom.
: É. Perfume é um convite.
C: Nesse grau, ele inteiro é um convite.
: Aliás, não só o perfume, mas todo esse momento; o momento presente é um convite.
C: Convite ao quê?
: Um convite ao próprio momento presente.
C: Sei. E esse momento presente nos faz escolher. Isso me inquieta. Como garantir que essa escolha é a melhor? E aquilo de que se abre mão para escolher algo? E todo o resto que fica de fora?
: Então... Penso que a escolha é uma liberdade que se impõe. Quase um imperativo. E você tem a responsabilidade de fazer o melhor possível do seu presente. Ele é tudo o que se tem. É o que você pode devorar, então saboreie. O resto é suposição.
C: É, verdade. O resto é suposição... O problema pode estar (interrupção da mesa ao lado: "irmãozinho, quebra mais um galho aí") na suposição. Negam o presente, imaginando o que fariam com outras escolhas. Tipo o sexo: se você transa com um carinha x pensando no y você não vive x nem y.
: Pois é...
C: O que as pessoas vão achar se descobrirem que eu estou transcrevendo isso?
: Vão achar que o momento presente é tão importante pra você que ele precisa ser registrado. Seria fantástico fazer isso sempre... o passado é sempre tão relativo. Lembrança é afeto; não dá pra confiar. Você só pode ter certeza sobre o presente. E mesmo assim...
C: Tô te achando muito sartreana nessa mesa de bar em Vila Isabel.
: Adoro um boteco. Como se você, com essa boina, não fizesse um ar muito mais blasé.
C: Adoro um blasé.
: Perceptível. Bom, a moral da história, pra ser bem Vila Isabel, tá no bife dessa mesa aqui do lado. No bom português: tem que comer enquanto tá quente. Isso é valer o presente. O resto é mal-passado.
E ponto.
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