terça-feira, 15 de março de 2011

Para os intensos

Antes de entrar no Pedro II para começar o tão esperado ensino médio, lembro claramente de ouvir minha mãe dizer: "agora você vai ter aula de Filosofia! Acho que vai gostar."
Depois da primeira aula, a suposição se confirmou. O professor não era lá muito didático, mas o primeiro contato com a matéria foi positivo.
Minha memória, ainda que seja falha em determinadas situações, sobretudo as que me desagradam estética ou politicamente, conservou vivo o primeiro trabalho. Deveríamos parafrasear Sócrates ao completar a lacuna: "uma vida sem ... não merece ser vivida." Eu, lutando contra o impulso de escrever "chocolate", "vinho tinto", ou, quem sabe, "sexo", escrevi algo não menos verdadeiro, sem o qual nenhuma das opções anteriores valeria: "paixão".
Carreguei a frase comigo durante todo o ensino médio. Fiz valer minha própria premissa e me apaixonei pela Filosofia.
Mais tarde, quando decidi cursar essa faculdade, com muito mais provas de que uma vida sem paixão, definitivamente, não merece ser vivida, esbarrei em questões que, curiosamente, me remeteram ao primeiro trabalho.
Com o estudo da Filosofia Política, já estava claro, para mim, que estudar a vida me interessava especialmente. Conheci, com paixão, as diversas concepções políticas que povoaram a Grécia Antiga e, mais tarde, me senti particularmente atingida pelo sufocante Leviatã de Hobbes. Penso que há beleza nesse tipo de matéria, porque trata de teorias que afetam pessoas e a forma como as pessoas se afetam (me) é inspiradora.
Algum tempo depois, descobri que, para alguém que se interessa pelo estudo da vida, pensar na morte é inevitável.
Nesse sentido, o existencialismo derruba vários tabus que cercam o fim. Hoje, escutando Lobão, ouvi: "mais vale viver 10 anos à mil do que mil anos à 10". Há quem discorde e Aristóteles provavelmente diria: "Sem extremos, caro compositor. Vamos viver 100 anos à 500, que tal?" O que mais interessa a partir da música é que a morte não deve ser negada.
Como diz o trecho de um livro bastante didático:

"Heidegger chegou ao ponto de afirmar que a existência humana é ser-indo-para-a-morte. Para viver autenticamente, temos de encarar de frente o fato de nossa mortalidade e assumir a responsabilidade de viver vidas significativas à sombra da morte. Não devemos tentar escapar da ansiedade pessoal e da responsabilidade pessoal negando esse fato.
...
Para Heidegger, viver à sombra da morte não é apenas mais corajoso; é o único jeito autêntico de viver, porque nossa hora pode chegar à qualquer minuto."


Enquanto ela não chega, Sartre, com a máxima "a existência precede a essência", nos dá o diploma de engenheiros da nossa própria vida. "Condenado a ser livre", é o que você está.
E, para os que adoram auto-definições, diz o livro, a partir de Sartre: "Somos seres indeterminados, sempre livres para nos reinventar".

Enfim, o existencialismo é uma corrente filosófica intensa, deliciosa, que grita a cada leitor uma sugestão; em mim, quase sempre ecoa meu primeiro trabalho de Filosofia e qualquer coisa repete, dentro: "uma vida sem paixão não merece ser vivida".

2 comentários:

Thaís disse...

"Existir... a que será que se destina?"
Não sei, não sei...
Vamos tateando!

Carine disse...

Pra quem estava com saudade de escrever algo grande,você ahazou.
Beijo,careca.