segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Enquanto isso, no Tribunal...

O mais sacana da vara diz alto:

_ É que agora o Pedro é poeta!!

Pedro é um rapaz alto, magro, com ar ligeiramente inseguro, talvez um pouco desconfiado, mas, de todo modo, um cara de bom humor.

Volta para a mesa rindo do comentário feito pelo sacana, que é um pouco barrigudo e espaçoso, em todos os sentidos. É o de humor mais notável. Aquele tipo de cara de liderança, que costuma ser popular no trabalho.

O mais velho da vara tampouco é o mais sério. No entanto, engana como ninguém. Quando o conheci pensei que ele era o chefe. É sério e ainda tem bigode. Morador de Ipanema, o primeiro comentário que vi sair de sua boca foi sobre a praia nos finais de semana, depois do metrô. "Aquilo lá virou o inferno depois daquele trem. Pelo menos durante a semana dá pra ter um pouco de paz." Esse é o mais velho da vara.

Depois de algum tempo - talvez depois de ter sentido cheiro de uísque entre uma hora de almoço e outra - nutri alguma simpatia por ele. Passei a observá-lo também. Ouvir suas histórias, medir seus afetos.

Ele quase sempre fala das filhas, que são muito inteligentes, bonitas, bem sucedidas; eu gosto de ouvir. Outro dia ele me falou: "você deveria juntar seu dinheiro e fazer um mochilão pela Europa, como o que minha filha fez".

Ouço seus conselhos contemplando a visão de quem tem 50 anos a mais de vida.

Foi com esses olhos que ouvi sua resposta ao mais sacana da vara, em meio ao sorriso do Pedro desconfiado, o mais velho disse:

_ O Pedro é poeta? Eu não sei... pra ser poeta tem que ter sofrido um pouquinho...

Na hora, meu hedonismo inteiro fez cara feia. Depois pensei que talvez, também, assim, devagar, depois do amor, amando, antes de amar; doer só um pouquinho, pra saber que vive.

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